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Monteiro Lobato: o pai do Jeca Tatu
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Ele era arredio, pouco falador, sobrancelhas enormes, de pequena estatura, sempre às voltas com a situação de desigualdade econômica da sociedade em que viveu, ao lado dos mais fracos contra os mais fortes, dos oprimidos contra os opressores. Toda sua obra é uma gigantesca luta. Luta contra trustes, contra governos, contra falsos patriotas, contra uma nação inerte e passiva. Luta para inundar de volumes um país que ainda não aprendera a ler e a amar os livros. Luta contra a ditadura de Vargas, luta para poder dizer livremente as coisas. Luta que acaba levando-o à prisão.

Monteiro Lobato foi quase tudo. Foi fazendeiro, vendedor de bilhetes de loteria, promotor, tradutor, escreveu livros para gente grande e para crianças, foi pintor, crítico, editor, reformador ortográfico, pai de família. Sempre esteve muito perto do homem e da terra, convivera com os caboclos das margens do rio Paraíba. Vira-os acocorados, incapazes de ação, tristes e desalentados espiando a vida com o olhar vago e sonâmbulo. Sua obra traduz esse cheiro forte de experiência e vida. Sentiu como ninguém a miséria do nosso caboclo. Lobato viu-o sentado de cócoras, picando fumo, botando fogo na mata para plantar meio roçado de mandioca, doente, incapaz de ação e de pensamento. Em sua obra surge esse “piolho da terra”, traça a caricatura desse homem, pondo suas mazelas de fora: nasce o JECA TATU. Ao traçar a triste figura do JECA TATU o escritor carrega, propositalmente, nas tintas. Era preciso curar o amarelão do JECA, ensiná-lo a ler e a escrever, despertá-lo para a vida, arrancá-lo do marasmo secular em que vivia.

Característica interessante da personalidade de Monteiro Lobato foi o seu temperamento arredio, anti-social e a nobreza de seu caráter. Não gostava de reuniões solenes, e por várias vezes recusou cargos importantes que lhe foram oferecidos. Foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras por unanimidade, título que recusou dizendo “mal comportado que sou, reconheço o meu lugar. O bom comportamento acadêmico lá de dentro me dá aflição...Rebelde nasci e rebelde pretendo morrer”.

Cansado dos adultos, o escritor resolve falar às crianças, talvez essas o escutem e o entendam. Então nasce o Sítio do Pica-Pau Amarelo. O Saci, Dona Benta, Pedrinho, Narizinho, Emília e muitos outros personagens maravilhosos humanos. Monteiro Lobato quebra a velha moral das histórias infantis, onde o bom é sempre premiado e o mau sempre castigado. Ele quer preparar a criança para a vida, educá-la, ensinar-lhe que o mundo é dos mais espertos e que um plano bem arquitetado sempre vence a força bruta. Diz Edgard Cavalheiro: “O intuito da obra infantil de Monteiro Lobato, não é portanto, o de moralizar, e sim o de ensinar. Divertindo num tom alegre e sadio, ele ensina história e geografia, gramática e aritmética, folclore e mitologia, ciência e tudo o mais que constitui a tortura dos cérebros infantis nas escolas e colégios. O próprio Pedrinho dia à sua avó: “Se o meu professor ensinasse como a senhora, a tal gramática virava brincadeira.

Monteiro Lobato faleceu a 4 de julho de 1948, ansioso por saber se a morte era vírgula, ponto e vírgula, ou ponto.

Nota: Esse texto, retirado do jornal “Nossa Gente” (extinto em 1977), dedico ao meu amigo jornalista Ivo Costa de Oliveira (Ivo Di “Sir” Jeep), por ser amante, divulgador e “tradutor” das obras desse grande escritor.

Nicete Campos
3/4/2008


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