Naiara
Olhar sério, o andar quase infantil, um sorriso tímido num rosto preocupado, a inquietude de uma juventude que insiste em transformá-la numa mulher, levou-a para sonhos sem fim. Sonhos compartilhados por tantas meninas-moças, como se um único espelho os refletisse igualmente em seus conteúdos, como se todo o interior humano fosse projetado em série, sonhos de quimeras de vida de passarelas e holofotes.
Não fosse a diferença gritante de aliar a ilusão com a realidade de reconhecer que cabia a si um quinhão de responsabilidade social, seria apenas mais uma sonhando...
Outros desejos a acompanhavam apesar da quase incompatibilidade entre eles. Sabia da exclusão social de muitos, entendia que se conseguisse aliar o útil ao agradável, poderia atender as suas necessidades ideológicas.
Uniu forças entre seus pares e foi tratar de concretizar seus anseios. Agora os passos eram mais firmes, determinação abriu-lhe sorriso largo num rosto bonito de espelho próprio. Enquanto cuidava do seu visual para atender suas necessidades, vez ou outra o macerava para levar alegria. Estátua-manequim no controle quase que total de seu corpo fazia crianças e adultos em festas beneficentes, pasmarem diante de tal talento.
Estudava, freqüentava cursos de passarelas e levava entretenimento aos sedentos de lazer.
A oportunidade de mostrar o que sabia fazer em matéria de desfile surgiu em forma de competição. Iria disputar em sua cidade a vaga de miss infanto-juvenil. Os incentivos em forma de palavras elogiosas chegavam de parentes e amigos, e assim, os preparativos para a melhor “performance” possível, iniciaram.
Chegado o grande dia, Nayara, apesar do nervosismo, arrumou-se lindamente!
Sabia que todas as suas concorrentes, naquele momento estavam tão aflitas e belas como ela. No camarim, uma de suas maiores preocupações era a de encantar seus pais que tanto por ela haviam feito.
Fez sua parte, não foi eleita...
Trabalhou com afinco. Foi vitoriosa!
O sonho maior permaneceu e até se fortaleceu. Um dia transformar-se-á em realidade. Não o sonho de espelho coletivo de causas individualistas, mas sim aquele de sonhos idealizados por todos que têm como pretensão maior serem felizes coletivamente.
Nicete Campos
2/8/2004